A lista de passageiros, no entanto, permanece em sigilo por cinco anos, uma medida que o governo justifica pela necessidade de proteger a segurança dos magistrados. Esse uso ocorre em um contexto em que a legislação não prevê explicitamente os ministros do STF como beneficiários diretos dessas aeronaves, mas uma brecha legal permite que o Ministério da Defesa autorize tais deslocamentos. O Supremo, por sua vez, assegura que todas as solicitações seguem rigorosamente as normas vigentes. A prática marca uma mudança significativa em relação a gestões anteriores, quando apenas o presidente do STF tinha acesso regular a voos oficiais, enquanto os demais ministros dependiam de caronas em viagens de outras autoridades. O objetivo principal, segundo o governo, é garantir a integridade física dos ministros, que enfrentam um cenário de maior exposição pública.
Dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) mostram que o ministro Roberto Barroso, presidente do STF desde setembro de 2023, foi o que mais utilizou os aviões, com 215 voos até dezembro de 2024. Essa parceria entre Executivo e Judiciário levanta questões sobre transparência e o uso de recursos públicos, alimentando discussões entre especialistas e a sociedade.
Contexto e Regras que Sustentam o Uso dos Aviões
A decisão de disponibilizar aviões da FAB aos ministros do STF tem como base um decreto de 2020, que regula o uso dessas aeronaves por autoridades públicas. O texto estabelece que vice-presidente, presidentes do Senado, da Câmara e do STF, além de ministros de Estado e comandantes militares, podem requisitar os voos oficialmente. Contudo, os demais ministros do Supremo não estão listados explicitamente, o que abre espaço para uma interpretação mais ampla: o Ministério da Defesa pode autorizar o transporte de outras autoridades, nacionais ou estrangeiras, em situações específicas.
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Até março de 2024, as solicitações partiam do Ministério da Justiça, mas, a partir de abril, o próprio STF assumiu a responsabilidade de acionar o governo para mobilizar as aeronaves. Em todos os casos, os voos aparecem registrados no site da FAB apenas como “à disposição” do Ministério da Defesa, sem detalhar os ocupantes. O Supremo destaca que a motivação principal é a segurança, baseada em análises técnicas que justificam a proteção dos magistrados.
Por outro lado, o Tribunal de Contas da União (TCU), em 2024, decidiu que os detalhes desses voos podem ser mantidos em sigilo, argumentando que a divulgação de rotas e passageiros poderia revelar padrões de viagem e comprometer a segurança das autoridades. Esse cenário reflete uma evolução na relação entre o governo Lula e o STF, que intensificou a cooperação administrativa desde o início do mandato. Durante o governo Bolsonaro, por exemplo, o uso de aviões da FAB por ministros do Supremo era menos frequente, com apenas 10 caronas registradas entre 2019 e 2022, contra 14 apenas no primeiro semestre de 2023. Assim, a gestão atual parece priorizar uma integração mais estreita com o Judiciário, utilizando recursos públicos para atender às demandas de deslocamento da Corte.
Impactos e Questionamentos sobre Transparência
A disponibilização de aviões da FAB aos ministros do STF trouxe à tona uma série de desdobramentos e análises sobre seu impacto na gestão pública e na relação entre os poderes. De um lado, o governo e o Supremo defendem a medida como essencial para a segurança dos magistrados, especialmente em um contexto de maior visibilidade e pressão sobre a Corte. Dados mostram que trajetos como Brasília-São Paulo são os mais comuns, com 145 das 154 viagens registradas, refletindo a rotina de ministros como Alexandre de Moraes, que mantém residência e compromissos acadêmicos na capital paulista.
No entanto, o sigilo de cinco anos imposto à lista de passageiros tem gerado críticas de especialistas em transparência. Para Bruno Morassutti, da ONG Fiquem Sabendo, a falta de divulgação sobre voos já realizados dificilmente oferece proteção adicional, enquanto prejudica o controle social. Marina Atoji, da Transparência Brasil, reforça que a publicidade é crucial para prestar contas à população, sugerindo que o sigilo só seria justificável antes das viagens.
Além disso, casos específicos, como o uso de um avião da FAB por Moraes na véspera de um jogo do Corinthians em São Paulo, levantam dúvidas sobre o real propósito de alguns deslocamentos. Esses episódios alimentam o debate sobre o equilíbrio entre segurança e accountability na administração pública. Enquanto o STF assegura que segue a legislação, o governo destaca que a medida foi alinhada para resguardar a integridade dos ministros. A prática também evidencia uma brecha nas regras, explorada para atender a uma demanda crescente da Corte, o que pode influenciar futuras discussões sobre o uso de recursos públicos por autoridades judiciais.
Perspectivas para o Futuro da Gestão dos Voos
O empréstimo de aviões da FAB aos ministros do STF pelo governo Lula consolida uma parceria administrativa que, embora respaldada por normas, abre espaço para reflexões sobre seu futuro. A medida, que já resultou em mais de 154 viagens desde 2023, reflete uma preocupação legítima com a segurança dos magistrados, mas também expõe fragilidades na transparência do uso de recursos públicos.
Com o sigilo de cinco anos mantido como política, a sociedade fica limitada em sua capacidade de fiscalizar quem utiliza as aeronaves e com que finalidade, o que pode gerar desconfiança em um momento em que a relação entre Executivo e Judiciário está sob escrutínio. Especialistas sugerem que o governo e o STF poderiam adotar mecanismos para equilibrar segurança e prestação de contas, como divulgar informações após um prazo menor ou detalhar os critérios técnicos que justificam os voos. Para o futuro, a tendência é que essa prática continue, especialmente se a percepção de risco aos ministros persistir.
A gestão Lula, ao priorizar essa cooperação, sinaliza um alinhamento com o Supremo, mas também assume o ônus de justificar o custo político e financeiro ao contribuinte. Enquanto isso, o TCU e o Congresso podem vir a pressionar por revisões nas regras, buscando maior clareza sobre o uso das aeronaves. O caso, portanto, permanece como um ponto de tensão entre a necessidade de proteção judicial e o princípio da publicidade na administração pública, com desdobramentos que dependerão do diálogo entre os poderes e da resposta da sociedade civil. Acesse mais notícias em Agora Notícias Brasil e acompanhe a categoria Política.