Setores da extrema direita colocam obstáculos na isenção do IR. Entenda o que está em jogo na TVT News
A Medida Provisória (MP 1251/24) de autoria do governo Lula que isenta o Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil deve ser aprovada no Congresso. A proposta conta com amplo apoio popular de acordo com diferentes institutos de pesquisa e até mesmo dentro das Casas Legislativas. Contudo, não é unanimidade. Particularmente setores ligados à extrema direita, ao bolsonarismo e ao rentismo de grandes empresários seguem pressionando contra a medida que trará maior justiça social.
Há uma certa vergonha (ou cálculo político) de alguns parlamentares de assumirem que defendem que os mais ricos paguem menos impostos do que os mais pobres. Então, não faltam argumentos, ainda que sem embasamento. O líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ), anunciou que a bancada do partido votará contra o projeto de isenção do IR. Segundo ele, a proposta “prejudica os microempresários”. O projeto, contudo, propõe aumentar a tributação apenas sobre quem ganha a partir de R$ 600 mil por ano – cerca de R$ 50.000 por mês sem ser empregado celetista.
Alterações no Congresso
A proposta, que aumenta a faixa de isenção do IR de R$ 3.036 para R$ 5.000, começará a valer em 2026, caso seja aprovada pelo Congresso. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), declarou, ao lado de Lula, que o Congresso fará alterações no texto. A nova isenção beneficiará cerca de 30 milhões de brasileiros e será custeada por 141 mil contribuintes de alta renda hoje pagam um teto de apenas 10% em tributos. O projeto também prevê uma tributação progressiva que concederá descontos para quem ganha até R$ 7.000.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, celebrou a apresentação do projeto como um “dia extraordinário” e afirmou que se trata da “1ª reforma tributária sobre a renda significativa” do país. Segundo ele, o Brasil está entre as 10 maiores economias do mundo, mas também figura entre as 10 nações mais desiguais. “Uma das principais razões é a ação do Estado (…) Tira do pobre para dar para o rico”, disse Haddad. Ele ainda ressaltou que o Congresso deu um passo “gigantesco” ao aprovar a reforma tributária sobre o consumo e destacou que o novo projeto desonerará investimentos, exportações e devolverá imposto às famílias do CadÚnico.
Quem é contra a isenção do IR
O PL defende que, ao invés de elevar a carga tributária para quem recebe mais de R$ 50 mil sem carteira assinada e atualmente não é tributado, o governo deveria implementar um pente-fino nos programas sociais. No entanto, especialistas apontam que essa medida não garantiria uma fonte de receita perene para sustentar a nova isenção, o que poderia ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Por outro lado, o PL não deve impedir a aprovação.
Parlamentares como a presidenta da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), Carolina de Toni (PL-PR) já disse que, na Câmara, o projeto deve contar com apoio de seu partido. O aceno é relevante, uma vez que é essencial que a CCJ aprecie a matéria e a libere para votação no Pleno da Casa.
O Partido Novo (que vem atuando como linha auxiliar do bolsonarismo), por sua vez, também tenta modificar a origem dos recursos para bancar a proposta, sugerindo cortes de gastos, o que, na prática, significaria reduzir investimentos em programas sociais como ambulâncias do Samu, o SUS, universidades públicas e o programa habitacional Minha Casa Minha Vida.
“Espero que derrubem. Mais um projeto de imposto, pauta única do governo e que mais uma vez sacrifica aqueles que produzem, o pequeno empregador, o empresário micro, aquele que, a duras custas, consegue ainda tirar algum provento para sustentar o seu negócio”, afirmou Portinho. O PL é uma das maiores bancadas do Senado, com 14 dos 81 senadores. Já o líder da Oposição na Casa, Rogério Marinho (PL-RN), disse que o grupo aguardará a proposta para definir sua posição e avaliar possíveis mudanças no texto.
Para o senador Marcos Rogério (PL-RO), a proposta apresentada pelo governo tem viés populista. “O que o governo está apresentando nesse momento é um conjunto de medidas que vai contra o que defendeu e apresenta a medida da isenção como uma vacina”, disse o político que, ironicamente, apoia ideologias que são contra vacinas.
Quem corrige o IR
Desde 2002, apenas Lula e Dilma corrigiram a tabela do IR. Jair Bolsonaro prometeu isenção do IR para salários de até R$ 5.000, mas não cumpriu. Posteriormente, prometeu ao menos corrigir a tabela pela inflação, o que também não foi realizado. Durante seu governo, a carga tributária sobre os mais pobres aumentou proporcionalmente.
Foto: Campanha Tributar os Super Ricos/Aroeira
Maior progressividade
No fim, a isenção do IR proposta por Lula é um passo em direção a um sistema tributário mais justo e progressivo. É o que argumenta o doutor em Sociologia por Oxford (Inglaterra) Celso Rocha de Barros, em artigo recente para a Folha de S.Paulo. “A isenção atinge a classe social mais debatida pelos analistas políticos nos últimos anos: quem já escapou da vulnerabilidade extrema, mas ainda está longe do padrão de consumo da classe média “tradicional”. É muita gente: o governo estima que a reforma beneficiará cerca de 10 milhões de pessoas”, disse.
“Na nova proposta, vários desses investimentos continuarão isentos. E o governo agora só vai exigir que o sujeito pague a mesma alíquota do PM se ele ganhar mais que R$ 100 mil por mês. Entre R$ 50 mil e R$ 100 mil haverá uma alíquota mínima, mas ela começará bem pequena e crescerá conforme a renda chegue perto dos R$ 100 mil. Todo mundo sabe que isso é certo. A proposta de tornar os impostos brasileiros mais progressivos estava até no programa da Arena, o partido que apoiava a ditadura militar. Mas ninguém tinha feito até agora”, completa.
A advogada especialista em Direito Tributário, Livia Heringer, do Ambiel Belfiore Gomes Hanna Advogados, também vê benefícios na reforma. “A proposta busca aliviar a carga tributária sobre a classe média e, ao mesmo tempo, aumentar a arrecadação sobre as faixas de renda mais altas, promovendo uma maior progressividade no sistema tributário”.
Ela, então, ajuda a entender os detalhes da isenção do IR. “quem ganha até R$ 5 mil por mês não pagará mais Imposto de Renda, pois essa será a nova faixa de isenção”. Já aqueles que recebem entre R$ 5.000,01 e R$ 7.000,00 terão um desconto progressivo no imposto devido. “Por exemplo, para quem ganha R$ 5.500,00, haverá uma redução de 75% no imposto. Quem recebe R$ 6.000,00 terá um desconto de 50%, e para rendas de R$ 6.500,00, o desconto será de 25%”, disse. “Já profissionais que recebem até R$ 50 mil mensais via PJ continuarão sem tributação sobre dividendos. Já aqueles que ultrapassarem esse valor passarão a pagar uma alíquota progressiva, que pode chegar a 10% para rendas a partir de R$ 1,2 milhão ao ano”, completa, sobre os pejotizados.