A maioria dos Estados brasileiros já havia reduzido ou eliminado a cobrança de ICMS sobre a cesta básica antes mesmo do governo federal solicitar o apoio dos governadores para diminuir o preço dos alimentos na semana passada. Um levantamento do Estadão/Broadcast revela que pelo menos 14 Estados já aplicam alíquotas diferenciadas nesses produtos, enquanto apenas um pretende adotar a medida após o apelo do governo.
O aumento no custo dos alimentos impactou diretamente a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, levando o governo a anunciar uma série de ações para conter a inflação desses itens. Entre essas medidas, o Planalto também pressionou os governos estaduais a colaborarem, o que gerou mais um ponto de atrito com os Estados. Especialistas, no entanto, questionam a efetividade dessas iniciativas.
O Estadão/Broadcast consultou os Estados para detalhar a tributação da cesta básica. Até a publicação deste texto, 15 responderam, e apenas o Piauí afirmou que ajustará a cobrança do ICMS após a solicitação do governo. Acre, Pará, Roraima, Bahia, Maranhão, Sergipe, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina já aplicam reduções ou isenções sobre produtos da cesta básica. Cada Estado define, de forma autônoma, quais itens são contemplados.
A alta dos alimentos se tornou um grande desafio para o governo no início de 2025, que busca soluções rápidas para um problema multifatorial. Entre os motivos que impulsionaram os preços estão a queda na produção, a variação cambial e a sazonalidade. Para tentar frear essa elevação, o governo propôs medidas tributárias, como a redução do Imposto de Importação para alguns produtos e o pedido de isenção do ICMS pelos Estados. No entanto, essas iniciativas tendem a ter um impacto limitado para o consumidor final.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, avalia que alterar tributos não será suficiente para reduzir o custo dos alimentos. “A questão não está nos impostos. Ao longo dos anos, a carga tributária sobre esses produtos já foi ajustada, e há pouca margem para novas reduções com efeitos significativos”, destaca. No caso do Imposto de Importação, além de a redução tarifária ser pequena, o Brasil é um grande exportador, o que limita o efeito da medida.
“Tivemos aumentos de preços muito mais expressivos no passado sem que fossem alvo de tanta discussão. O governo evita tomar medidas que realmente surtiriam efeito, como desacelerar a economia, e aposta em soluções ineficazes. Como a safra será boa, a tendência é que os preços subam menos este ano. O governo acabará se beneficiando dessa queda, mas sem relação com a redução de impostos”, argumenta.
O vice-presidente de turma no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e especialista em direito tributário, Laércio Uliana, lembra que, para que os Estados reduzam o ICMS da cesta básica, é necessário aval do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e aprovação nas assembleias legislativas. Apesar do apelo eleitoral dessas propostas, ele não acredita que a medida trará uma redução expressiva nos preços dos alimentos. “O que impulsionou a alta dos preços foi a escassez dos produtos e a valorização do dólar, que encarece a compra de insumos”, afirma.
A discussão sobre a isenção da cesta básica é antiga e complexa, reforça André Mendes Moreira, sócio do SCMD Advogados. Ele ressalta que, embora o ajuste nas alíquotas e bases de cálculo tenha efeitos similares, ele difere da isenção total, que exige aprovação de uma legislação específica e um processo mais burocrático.