O ex-ministro da Defesa, general Walter Braga Netto, recebeu a primeira visita de um político desde sua prisão, em dezembro de 2024. O encontro, ocorrido nesta terça-feira (15), foi marcado por momentos de oração, reflexões sobre a fé e análises do cenário político atual. O visitante foi o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder do partido na Câmara dos Deputados. Braga Netto está detido na 1ª Divisão do Exército, na Vila Militar, zona oeste do Rio de Janeiro, acusado de obstrução de justiça no inquérito sobre a tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro.
Encontro marcado por apoio e espiritualidade
Durante a visita, que durou cerca de 40 minutos, Sóstenes contou que Braga Netto demonstrou serenidade e confiança, além de gratidão pela articulação política que resultou no avanço do projeto de anistia para os envolvidos nos atos do 8 de janeiro. O general parabenizou o deputado pelo requerimento de urgência apresentado na Câmara e destacou que considera-se vítima de uma injustiça. Como símbolo de fé e esperança, os dois oraram juntos e Sóstenes presenteou o militar com o livro cristão “Uma Vida com Propósitos”, de Rick Warren.
Segundo o parlamentar, Braga Netto relatou que perdeu peso praticando exercícios físicos e destacou que não possui privilégios no local onde cumpre a prisão preventiva. Ele está isolado em um espaço com quarto e banheiro, e se alimenta da comida servida aos demais militares do quartel. A presença de uma televisão com canais abertos é o único recurso extra que lhe permite acompanhar os acontecimentos do país.
Argumentos de defesa e críticas à denúncia
Ao longo da conversa com Sóstenes, o general reforçou seu posicionamento de inocência. A defesa de Braga Netto sustenta que a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) é “ilógica e fantasiosa”. Os advogados argumentam que não existem provas concretas de que o ex-ministro tenha atuado para obstruir a justiça ou participado de articulações golpistas. A acusação se baseia, entre outros elementos, em trocas de mensagens e ligações com o general Mauro Lourena Cid, pai de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro.
Segundo Braga Netto, ele apenas respondeu às iniciativas de contato feitas por Lourena Cid, e não houve intenção de interferir nas investigações. Além disso, teria afirmado a Sóstenes que “nunca ouviu a palavra golpe” em nenhuma das reuniões de que participou. O ex-ministro também comentou estar “assombrado” com o envolvimento de militares jovens conhecidos como “kids pretos”, um grupo de forças especiais do Exército, citado na denúncia como responsável pela elaboração de um plano de ruptura institucional.
Visitas políticas autorizadas pelo STF
Na semana passada, o ministro Alexandre de Moraes autorizou visitas políticas ao ex-ministro, estabelecendo que elas devem ocorrer entre 14h e 16h, em grupos de até três pessoas. Segundo Sóstenes, a próxima rodada de visitas está prevista para quinta-feira (17) e contará com a presença dos senadores Damares Alves (Republicanos-DF) e Hamilton Mourão (Republicanos-RS). Ambos são nomes de peso na política conservadora e têm manifestado apoio a uma reavaliação dos processos judiciais relacionados aos atos de 8 de janeiro.
A iniciativa de visita reflete não apenas uma postura de solidariedade política, mas também o alinhamento de lideranças do PL em torno do projeto de anistia. A proposta, que já conta com centenas de assinaturas no Congresso, visa extinguir penas e processos contra os envolvidos nos atos considerados antidemocráticos. Para seus defensores, a medida é necessária para promover pacificação nacional; para críticos, representa um perigoso precedente de impunidade.
As acusações da PGR contra Braga Netto
Braga Netto é um dos oito denunciados pela PGR por integrar o “primeiro núcleo” da suposta tentativa de golpe de Estado. De acordo com a denúncia, ele teria sediado, em sua própria casa, reuniões estratégicas com militares de elite, incluindo os “kids pretos”, com o objetivo de planejar uma intervenção institucional. A denúncia também afirma que ele agiu para intimidar membros da cúpula das Forças Armadas que se opuseram ao movimento golpista, além de participar da elaboração da chamada “Operação Punhal Verde e Amarelo”.
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Segundo o documento da PGR, essa operação previa até mesmo o assassinato de autoridades como o ministro Alexandre de Moraes, o presidente Lula (PT) e o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). A acusação causou forte reação dos advogados do general, que ironizaram o conteúdo ao dizer que ele se assemelha “a um filme ruim, sem sentido e cheio de furos”. Para a defesa, há ausência total de provas que sustentem a gravidade das alegações feitas.
Um vice de Bolsonaro no centro da crise
Candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro nas eleições de 2022, Braga Netto tornou-se uma das figuras mais emblemáticas entre os aliados do ex-presidente investigados por suposta conspiração contra as instituições democráticas. A denúncia contra ele reforça o discurso de setores da esquerda de que houve, de fato, uma articulação golpista de alto nível, envolvendo militares e civis próximos ao ex-chefe do Executivo.
Por outro lado, apoiadores do general e de Bolsonaro afirmam que o inquérito está contaminado por motivações políticas e ideológicas. A prisão de Braga Netto, que já dura mais de 120 dias, tornou-se um símbolo para a militância conservadora, que vê nele um mártir da luta contra o que chamam de “ditadura do Judiciário”.
O futuro do processo e seus desdobramentos
Com a denúncia já aceita pelo Supremo Tribunal Federal, Braga Netto e os demais réus enfrentam agora uma fase decisiva do processo. Se condenado, o general poderá cumprir pena em regime fechado, o que representaria um marco sem precedentes na história política recente do Brasil: a punição severa de uma figura de alta patente do Exército por tentativa de golpe.
Enquanto isso, no Congresso, o embate em torno do projeto de anistia continua. A visita de Sóstenes Cavalcante e a articulação do PL indicam que a oposição pretende pressionar o governo e o STF por uma flexibilização das medidas. A disputa jurídica e política sobre o 8 de janeiro ainda está longe de acabar.