O candidato Guilherme Boulos (PSOL) levou à propaganda de sua campanha à Prefeitura de São Paulo o mote de que “entregou casas” como líder nacional do MTST, em tom que destoa do usado por ele próprio no passado, quando enfatizava o esforço coletivo do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto.
A frase “Boulos já entregou mais de 15 mil casas” foi falada por uma locutora e exibida na tela no horário eleitoral nos últimos dias, em anúncios que abordam a trajetória do deputado federal e buscam rebater as pechas de invasor e radical exploradas por adversários como o prefeito Ricardo Nunes (MDB).
Diferentemente do viés personalista de agora, Boulos já disse que moradias construídas para atender o MTST foram resultado da “luta do movimento popular” e de políticas públicas de habitação.
Procurado, o MTST afirmou que “reconhece o importante papel” de Boulos “na conquista de moradia popular”. Já a campanha declarou que a liderança dele, enquanto coordenou a organização, “é amplamente reconhecida por seus integrantes” e ressaltou as articulações feitas por ele.
Boulos entrou em 2002 no grupo, que adota a invasão de terrenos como instrumento de denúncia e pressão, e deixou a direção ao assumir o mandato na Câmara, em 2023, segundo sua assessoria. Sua campanha a prefeito utiliza a tese de que “o MTST não invade casas, mas, sim, dá casas”.
Para atingir seu objetivo, o movimento depende do apoio de recursos públicos, seja para desapropriação de áreas, seja para a construção dos empreendimentos, financiados por meio do programa federal Minha Casa, Minha Vida e de políticas de governos estaduais e municipais.
“Ninguém que deu de presente essas casas. Elas [casas] foram alcançadas com muita luta, por meio do movimento, o MTST. O que se vê, mais uma vez, é que a política de moradia popular vale a pena”, disse Boulos em 2019 na entrega de 910 apartamentos em Santo André (SP), segundo texto no site do MTST.
Em discurso, ele deu parabéns aos “guerreiros e guerreiras” e exaltou o esforço de famílias “que moraram debaixo de lona preta por sete anos” e conseguiram realizar um sonho.
Os dois condomínios foram erguidos por meio do Minha Casa, Minha Vida Entidades, modalidade em que a execução da obra é assumida por entidades de moradia e os beneficiários têm subsídio do governo nas prestações.
Em 2022, ao falar a membros do MTST no início das obras de um conjunto em Taboão da Serra (SP) para mais de 300 famílias, Boulos se colocou no mesmo patamar dos integrantes, citando “os tantos momentos que a gente já passou nessa luta”. “Cada tijolo dessa obra é um pedacinho da luta de vocês, da esperança de vocês”, disse.
Na ocasião, ele afirmou ainda que a conquista se deu “a partir da luta do movimento popular, a partir da organização e a partir das políticas públicas”. E completou: “Esse é o caminho [em] que a gente acredita”.
O MTST descreve suas ações como fruto “da organização das trabalhadoras e trabalhadores urbanos mais pobres e precarizados”.
Desde a pré-campanha, a influência de Boulos na viabilização de casas ganhou protagonismo nas mensagens do candidato.
Em julho, durante sabatina Folha/UOL, ele disse: “Sem a caneta, já ajudei mais de 15 mil famílias [em São Paulo e região metropolitana] a conquistarem suas casas. Isso me orgulha demais”.
Num vídeo divulgado nas redes sociais no último dia 5 sobre o caso Pinheirinho, reintegração de posse em 2012 em São José dos Campos (SP) marcada por violência, a locutora afirma que, “graças à luta, hoje as famílias que foram despejadas moram em suas casas que foram conquistadas”.
Outro material, exibido no horário eleitoral, focaliza os condomínios de Santo André -um deles batizado como Novo Pinheirinho- e diz que os prédios foram conseguidos “através do trabalho do MTST, do esforço coletivo do movimento e do programa Minha Casa, Minha Vida Entidades”.
Nos novos comerciais, a afirmação de que Boulos “entregou casas” é frequente. A expressão apareceu em um vídeo sobre o conjunto habitacional Copa do Povo, que começou a ser executado pelo MTST no ano passado, por meio do braço para entidades do programa federal. O presidente Lula (PT), principal cabo eleitoral do candidato, dividiu o palco com ele na cerimônia de assinatura do contrato, em dezembro.
O vídeo trata o empreendimento como “um processo conduzido da maneira correta, com o apoio do poder público, para a conquista da casa própria” e mostra testemunhos de membros do MTST. Um deles, identificado como o vigilante Nelson Guimarães, diz: “O Guilherme não é invasor de terreno, é construtor de casa”.
O MTST não respondeu diretamente se concorda com as afirmações de que Boulos entregou casas. Em nota, o movimento disse que “são 15 mil famílias que, graças à atuação e capacidade de diálogo de Boulos, hoje têm garantida uma moradia digna para viver”.
A campanha do PSOL também falou em reconhecimento dos integrantes à liderança de Boulos, “defendendo o direito à moradia e o cumprimento do Estatuto das Cidades”, e disse ser “no mínimo estranho que a Folha de S.Paulo questione algo que o próprio MTST jamais contestou”.
“Ele atuou no MTST por 20 anos e exerceu papel fundamental no diálogo e articulação para assegurar moradia para 15 mil famílias”, declarou, por meio de sua assessoria.
A nota provocou Nunes ao afirmar que “é irrefutável que, mesmo sem a caneta na mão, Boulos conseguiu fazer mais pelos trabalhadores sem teto do que o atual prefeito”. O candidato à reeleição propaga ter feito o “maior programa habitacional da história da cidade”, com 72 mil unidades entregues ou contratadas.